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terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Natal na Alemanha: saudades do tempo em que a neve era de algodão e o Papai Noel suava em bicas


Quando eu era criança, adorava ficar colocando bolinhas de algodão na árvore de Natal, aquele pinheiro que tinha que ser montado no dia 23 pra ainda estar verde no dia 24, tamanho é o calor que faz em Blumenau nessa época do ano. Mas eu achava que aquele algodão era igualzinho a neve e, na minha cabeça, com pouco senso estético, era como ter um Natal branco. Depois de seis anos na Europa, nunca tive um, embora a previsão do tempo sempre me encha de esperança e salve minha árvore dos algodõezinhos.  

Na Alemanha descobri um Natal mais parecido com os contos de fada. Os mercados com seu perfume de amêndoas carameladas e vinho quente temperado. A decoração de bonecos de neve, renas e quebra-nozes, com uma presença pequena do vermelho Noel, frequente no Brasil. O frio, o vapor quente que sai da boca, a mão coberta de luvas para carregar as sacolas com presentes e os ingredientes enjambrados para fazer uma ceia brasileira no outro lado do oceano.

O Natal na Alemanha é o Natal que eu sonhava na minha infância e o Natal da minha infância é o que tem me feito sonhar todos os dias agora. Mesmo que todo o Papai Noel pareça ridículo quando o termômetro marca 40 graus, sinto falta de ver aqueles heróis (e heroínas, algumas vezes!) de algodão colado na cara ou usando aquelas máscaras plásticas de traumatizar qualquer infância, derretendo de calor sob uma touca vermelha. Ando com saudade de suar para limpar a casa e de passar horas cozinhando pratos que nada combinam com a temperatura tropical.


Mas o que eu mais sinto falta, mesmo, são os cheiros. Na semana no Natal, a grama da minha casa sempre era cortada, um zelo de deixar tudo pronto para receber visitas, e quando a máquina picava as folhas, o sol cozinhava tudo e subia aquele cheiro. Melhor que isso, só cheiro de trovoada.  Na casa da minha infância – que era lilás! Ah, quem teve o privilégio de viver em uma casa lilás com verdinho!?!? – o chão era de madeira e se fecho os olhos, o cheiro de cera cremosa passada a duras penas pelo assoalho sobe pelas minhas narinas. Se mistura no ar com o cheiro de óleo de peroba e a cara vermelha da minha mãe, esbaforida, tirando mais uma formada de bolachas do forno.

Sinto falta do cheiro da minha cidade, dos pés ganhando calos das sandálias que batem a rua XV de ponta a ponta em busca dos últimos presentes. Sinto falta dos amigos secretos, dos tantos encerramentos e festas de fim de ano que se tem: da hidroginástica, do clube, da confraria, do trabalho, das amigas... Sinto falta até mesmo dos presentes trocados nesses momentos, que quase sempre eram uma desgraça e rendiam antipatias até o Carnaval.

Lembro de uma vez, em um desses amigos tantos, que fui presenteada com um corte de tecido de viscose estampado, quando tudo o que eu queria era uma imitação de sandália plástica que custava cinco a menos do que o preço acordado. Vai ver meu amigo da época suspeitou de um gosto que eu não demoraria a questionar.

E para piorar essas saudades tantas, esse ano minha árvore jaz em uma caixa, os enfeites em outra e a chance de eles se encontrarem são as menores do mundo. Estou me mudando mais uma vez e, de Natal,  só mesmo os mercados da rua, e sua mesmice impessoal: sem uma árvore montada em casa, a cidade mais parece um showroom de decoração para uma temporada de festas que esse ano não chegou pra mim.

As saudades são enormes, tantas que doem. Poucas vezes tive tanta nostalgia de Natais já idos e nunca antes achei que um Natal suarento tivesse tanta graça. Trocaria qualquer chocolate suíço por uma sombrinha de chocolate Saturno, doce e hidrogenado, que minha mãe pendurava na árvore junto com os papais-noéis e bolas de vidro...



Esse post faz parte do “Coletivo de Natal” do grupo Blogueiros e Blogueiras brasileiros na Alemanha. Para conhecer outros trabalhos sobre a natividade preparados pelos lusófon@s, clique aqui.



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