Luto: funcionário desce a bandeira a meio mastro no Museu das Armas
Pensei que fosse piada, mas abri um site de noticias só pra ter certeza. A manchete era clara. Um ataque com – até entao – pelo menos quatro mortos. A notícia deu sentido a movimentacao de carros a paisana, mas com sirenes ligadas, que estavamos vendo nas ruas: alguns deles cortanto as largas avenidas da cidade na contramao. Segui as noticias aos poucos, a medida que, por ironia, avancava pelos corredores do Museu das Armas, com meu marido e um casal de cunhados recem chegado de Florianopolis para uma visita.
Foi so na saida do complexo historico que me dei conta que se tratava de uma tragedia. Um funcionario descia a bandeira francesa ate o meio do mastro no alto da Tumba de Napoleao, enquanto o burburinho da cidade, misturado ao vento gelado de inverno, era cortado por sirenes a cada momento.
Tenho a impressao que muitos turistas nem se deram conta que algo se passou, a nao ser pelo aumento dos policiais nas ruas e, especialmente nas estacoes de trem e metro. Algumas foram fechadas por razoes de seguranca, como a La Republique, onde uma manifestacao em solidariedade as vitimas reuniu milhares de pessoas, o que soh fiquei sabendo mais tarde, ja em casa.
A estacao do proxima ao boulevard Richard-Lenoir, onde aconteceu o massacre, ainda estava fechada no inicio da noite, mas nos arredores da casa onde estou, a menos de dois quilometros da sede do semanario, poderia ser mais um dia qualquer. Meu frances nao serve para entender as sutilezas das conversas de metro, mas tudo parecia mais calado que o normal.
Foi so em casa que vi os videos do ataque e que pude pensar no quao vil e covarde foi tudo isso. Ja tinha enfrentado uma situacao de tristeza parecida no final de 2012. Eu morava em Bonn, na Alemanha, na época em que salafistas deixaram uma bomba de alto poder de destruicao na estacao de trem por onde eu passava todos os dias. Uma falha na montagem evitou a explosao, mas nada evitou o sentimento de vulnerabilidade que tomou conta da cidade e que se repete agora na Franca.
O que aconteceu em Paris nessa quarta-feira serve de alimento para os crescentes movimentos de extrema direita que se espalham pelas ruas da europa e pelas urnas a cada eleicao. Mas apesar da dor e das feridas, apesar do fundo religioso dos ataques, os tiros contra o Charlie Hebdo nao podem servir de municao para a generalizao de um sentimento anti-islamico. As canetas que ficarao caidas nas mesas falavam de liberdade e tolerancia e esse discurso nao pode se calar com balas.
Paris fica mais cinza a partir dessa quarta-feira e a imprensa vai seguir de luto mesmo depois que as bandeiras voltarem ao topo dos mastros na cidade Luz.
Ps.: Desculpa pela falta de acentuacao. Arrumo isso assim que voltar a Alemanha.
Um comentário:
Pois é, Ivana, tenho a mesma sensação... que agora a direita vai vir com tudo, não só na França como nos países vizinhos. Por uma trágica coincidência, eu tinha acabado de ler "Amor Líquido", do Zygmunt Bauman, na terça feira: no terceiro e quarto capítulos ele fala justamente sobre xenofobia, a dificuldade de amar o estrangeiro - e ainda usa o exemplo francês para ilustrar tudo. Já falei para a minha vó que não estranharia se, muito em breve, nos depararmos com propostas de "registros de estrangeiros" (alguém já viu esse filme?)...
Beijo e se cuida!
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