Nazismo e
holocausto ainda são – e sempre vão ser – um tema espinhoso para a Alemanha e
para qualquer alemão. Não é um tema sobre o qual se possa fazer piada: e isso
os brasileiros precisam aprender de uma vez por todas. É um daqueles assuntos
proibidos em festas, conversas ou qualquer situação, a não ser com quem se
tenha muita, muita intimidade mesmo. E
para Berlin, essa regra vale ainda com mais ênfase. Por aqui, as lembranças dos
anos em que o terceiro Reich comandou a Alemanha são ainda mais evidentes: seja
na arquitetura característica dos anos de Nacional Socialismo ainda presente
pelas ruas importantes da cidade, seja pelos memoriais e museus que fazem parte
do roteiro obrigatório de quem visita a capital alemã.
Esse post é
para falar dessas atrações mas também para fazer um desabafo. Um xingamento,
quase. É para todos os “alemães” do Vale do Itajaí (e de outros rincões
colonizados no Brasil e no mundo) saberem o quão sem tamanho é o ridículo de
achar que ser alemão é ser nazista. E pior: de achar que isso é uma coisa
bacana. Quero escrever aqui com todas as letras: quem pensa assim é ignorante,
otário, mal informado e sobretudo babaca, muito babaca. Mais ainda quem sai aos
quatro ventos propagando um revisionismo que nega o holocausto: esses deveriam
ser presos. O que aconteceu na Alemanha
durante a Segunda Guerra mundial foi muito sério e muito grave e as marcas
estão em cada um que aqui vive e logo são percebidas por quem adota o país como
lar.
Eu só não
entendo por que, entre tantas parcerias e “missões” que os nobres políticos
catarinenses fazem aqui na Alemanha, nenhuma delas tratou de recursos para um
projeto educacional que levasse
informação clara e detalhada sobre os regimes totalitaristas para dentro da
sala de aula: eu posso apostar que não faltariam instituições interessadas em
apoiar a ideia.
Bom,
opiniões à parte, que esse post seja mais do que um guia de turismo: que possa
servir para levar informações e inspiração para quem planeja visitar Berlin. Então,
sem mais delongas, vamos à lista temática do que há para ver na cidade. Existem
outros locais, museus e afins. Essa é uma lista de sugestões entre o que há de
mais significativo.
Memorial
dos Judeus Mortos na Europa – Vir para Berlin e não visitar o memorial é como
ir para Roma e não ver o papa. Os 2711 blocos de pedra, inaugurados em 2004, já
configuram uma das mais tradicionais imagens de Berlin. Ficam bem próximos do
Brandenburg Tor e podem ser visitados a qualquer hora. O centro de informação,
porém, tem horários específicos conforme a época do ano. Trata-se de uma
espécie de museu e que a trajetória da perseguição aos judeus é contada em murais
e fotos. Depoimentos, fragmentos de cartas e postais e vídeos complementam o
espaço, em uma tocante narrativa sobre o terror do holocausto. No fim da
visita, é possível consultar a base de dados do memorial em busca de nomes de
judeus mortos durante o período da guerra.
Lápides: Memorial aos Judeus relembra os mortos durante a 2ª Guerra Mundial
Cartões e cartas: histórias de despedidas e desespero estão narradas em fragmentos reais
Crueldade: fotos mostram os horrores do período da guerra
Memorial
aos Homossexuais – Em frente ao Memorial dos Judeus Mortos na Europa, já dentro
do Tiergarten, há mais uma lápide, similar às que formam o complexo que
relembra o massacre. Desta vez, trata-se de uma homenagem aos homossexuais, também
perseguidos pelo regime nacional socialista. Em uma das pontas da lápide há uma
pequena janela de vidro, pela qual fica à mostra um monitor que exibe beijos de
casais gays.
Memória: dentro da estrutura, vídeo mostra beijos de casais gays
Topografia
do Terror – Trata-se de um centro de documentação que, em sua área externa,
mostra os restos das paredes e os fundamentos do que já foi o quartel-general
da SS e da Gestapo, as forças policiais do regime nazista. Um pedaço do muro de Berlin ainda está no local. O espaço tem
bastante foco nas ações repressoras coordenadas por Heinrich Himmler, um dos
principais personagens da perseguição aos judeus e outras minorias. A história
contada no espaço complementa a do Memorial dos Judeus Mortos na Europa: o
centro de documentação mostra as engrenagens da máquina de matar construída
pelos Nazistas e como ela operava.
Documentação: porões do espaço que já foi sede da SS serve hoje como memorial
Marcante: um trecho do muro foi preservado e pode ser visitado
Bunker de
Hitler – Esse não é um ponto turístico e nem poderia ser diferente. Não há
espaço na Alemanha para qualquer lugar que possa se tornar ponto de culto para
neo-nazis de plantão. O lugar onde ficava a casamata onde Hitler, sua família e
outros oficiais do nazismo tiveram seu fim foi inundado, aterrado e hoje abriga
um estacionamento. Fica ao lado do Memorial dos Judeus Mortos na Europa (na
Gertrud-Kolmar-Str) e apenas uma placa – colocada pelos moradores vizinhos –
conta a história do local e mostra a planta dos subterrâneos da fortaleza.
Estacionamento: não há referência ao bunker em guias de turismo sobre Berlin
Campo de
Concentração de Sachsenhausen – Esta é, provavelmente, a visita mais triste que
se pode fazer em Berlin. O campo de concentração, que fica nos arredores da
cidade (cerca de 35 minutos de trem), foi o primeiro a ser construído e passou
a funcionar já em 1936, primeiro como prisão e, depois, como local de matança. Cerca de 200 mil pessoas passara por lá. Os galpões onde os judeus eram alojados de maneira sub-humana, os barracões de enfermaria
– onde eram conduzidas experiências com os prisioneiros, a área de fuzilamento
e os fornos, onde eram queimados os milhares de corpos, ainda estão no local. A
dimensão do espaço é superlativa e o horror é ainda maior quando se imagina que
Sachsenhausen foi um dos menores campos. Com o fim da guerra, o campo de
Sachsenhausen foi tomado pelos russos e transformado em uma prisão militar. A visita leva ao menos três horas (a partir da chegada no campo) e por isso é bom conferir os horários de funcionamento antes de fazer o deslocamento.
Portões abertos: visitantes ainda encontram o lema "O trabalho liberta"
Fornos: estruturas eram usadas para cremar os corpos dos judeus mortos a tiros ou gás
Galpões: eram dezenas de galpões imensos, repletos de beliches
Kaiser
Wilhelm Gedächtniskirche - A igreja, que
fica no início da luxuosa avenida Kurfürstendamm é um dos cartões postais da
cidade e marco presente da destruição provocada na Segunda Guerra Mundial.
Junto a estrutura severamente danificada, foi construída uma nova igreja e um memorial, embora a torre semidestruída tenha sido mantida. Atualmente, a torre
passa por uma reforma e está envolta em tapumes: mas ela não será reconstruída.
Apenas restaurada para que permaneça da forma como ficou após os bombardeios
sofridos em 1943.
Em reforma: tapumes brancos cobrem a torre atingida por bombardeios
Museu dos
Judeus – Aberto em 2001, o museu conta a história de 2000 anos de presença
judaica em Berlin. A história é contada de forma a revelar o porquê as
perseguições começaram e mostra ainda como viviam essas pessoas antes da
guerra. O museu está na lista dos melhores da cidade.
Centro Anne
Frank – Embora Anne Frank nunca tenha colocado os pés na cidade, uma exposição
contando sua história foi montada em 1994 para marcar os 50 anos da liberação
dos prisioneiros do Nacional Socialismo. O material produzido acabou se
transformando em uma exibição permanente.
Casa da Conferência de Wannsee – Um importante capítulo na história da Segunda Guerra Mundial foi escrito em 20 de janeiro de 1942, quando os mais graduados oficiais nazistas se reuniram em uma casa no bairro balneário de Wannsee, em Berlin, para dar encaminhamento ao que ficou conhecido como “a solução final” para os judeus. Neste encontro, a Conferência de Wannsee, não houve discussão sob se as vidas seriam preservadas ou como os prisioneiros seriam tratados: essa já era uma decisão tomada e o foco do encontro era em como exterminar aqueles que os nazistas consideravam uma sub-raça (Untermensch). A casa onde foi feita esta reunião foi transformada em um memorial e pode ser visitada gratuitamente.
Mansão: casa onde foi realizada a Conferência de Wannsee virou um memorial*
Arquitetura
nazista – Passear por Berlin é, cruzar, em suas esquinas, com prédios que
remontam ao III Reich, construídos em um estilo particular: inspirados no classicismo
Romano, porém com linhas sóbrias e retas, muitas vezes chamado de “Severe deco”.
Uma vez percebida a identidade das fachadas, fica fácil reconhecer as
estruturas e duas das mais representativas construções são, sem dúvida, o
prédio do Ministério Federal das Finanças (durante o III Reich, era o Reichsluftfahrtministerium - Ministério da Aeronáutica) e o Estádio Olímpico de Berlin. Em
outros, as fachadas ainda trazem suásticas dissimuladas em arabescos
decorativos ou, por vezes, a águia que carregava o símbolo nazista não foi
apagada, como na fachada do ministério das finanças do bairro de
Charlottenburg.
Ministério das finanças: arquitetura sóbria remonta ao regime fascista alemão
Charlottenburg: a águia nazista não foi apagada da fachada do ministério das finanças
Estádio Olímpico: linhas retas e concreto marcam o estilo da obra inaugurada em 1936
* Foto de Clemensfranz, publicada originalmente aqui, licenciada conforme o Creative Commons.