Mas o post tem outra motivação. Outro dia compartilhei no Facebook um texto de um americano que lista uma série de motivos pelos quais ele odiou ter morado no Brasil e as reações foram as mais extremas. Os brasileiros têm uma dificuldade absurda em receber qualquer crítica: ainda mais de alguém de fora. Devo confessar que o americano em questão teve uma experiência ruim e algumas comentários são mal humorados, mas concordo com quase tudo o que ele escreveu.
O problema do Brasil são os detalhes. Falo isso como alguém que, mesmo vivendo fora, ama o seu país. Aliás, ama o suficiente pra ter uma visão crítica – e autocrítica também. Não se trata de chatice ou frescura e nem de achar que na Europa tudo é lindo ou melhor. Mas existem coisas bem brasileiras que me tiram do sério. Só para enumerar algumas: atrasos, pessoas que aparecem sem avisar, gente que confirma que vai e não aparece.
No entanto, são experiências vividas em viagens de trabalho – e sendo tratada como estrangeira, pela falta de sol gritante que minha pele tem emanado ultimamente – que mostram que tudo poderia sair bem, não fossem os detalhes. Ok, detalhes nem tão pequenos algumas vezes, especialmente no tratamento a quem vem de fora. Faço o relato como brasileira – e não entendam como um queixume típico de classe média, mas sim como uma forma de apontar as falhas que serão potencializadas durante a Copa. Os relatos são um alerta de situações semelhantes àquelas que os turistas do mundo inteiro vão enfrentar aqui. Eu, que estou no meu país, falando a minha língua materna, fiquei muitas vezes sem palavras... Pra quem vem de fora e vai depender do inglês de cinco frases decoradas de quem presta serviços, a coisa deve ser bem pior.
Vamos aos fatos. O táxi é um claro exemplo disso. É eu entrar em um que o motorista começa a dar voltas. Não que eu conheça as cidades todas por onde andei, mas criei o (saudável, penso!) hábito de verificar as rotas antes e não preciso de um GPS para saber que estão indo para outro lado. Ligar o taxímetro parece um pedido de outro mundo. Alguns aeroportos, como o de Manaus, oferecem a possibilidade de pagar o taxi antecipadamente para uma corrida até os hotéis do Centro, por exemplo. Nesse caso, se você pagar com cartão de crédito (na própria central de taxi, que oferece essa possibilidade), esteja preparado para ser empurrado de um motorista para outro, já que ninguém quer a corrida.
Se chegar no hotel (não um cinco estrelas, mas um hotel de boa categoria turístico-empresarial, por assim dizer, que exibe orgulhoso a plaquinha de “alojamento credenciado pela FIFA para a Copa do Mundo), prepare-se. Primeiro para um check-in demorado. Depois para ficar sem papel higiênico, sem toalhas (e não reclame dos furos ou bordas esfarrapadas quando chegarem, afinal, estão limpas). Prepare-se para pagar 15 reais para lavar uma calça jeans e para esperar três dias até que sua roupa seja localizada. E para ouvir do hotel que eles não tem qualquer responsabilidade sobre isso, já que o serviço é terceirizado.
“Esquecerem” de arrumar o quarto também acontece. Some isso a telefone quebrado, tv de caixote com muito chuvisco e chuveiro elétrico que não funciona. Cada vez que conto para alguém aqui na Alemanha que no Brasil usamos chuveiros elétricos a pessoa se contorce de pavor e faz uma cara de: como vocês não morreram eletrocutados ainda? Pois é, nem eu sei. Ah, e também tem hotel “eco” que para economizar regula o frigobar em uma temperatura que a água fica mais gelada se deixada no balcão, só com o ar condicionado.
Outra coisa que vale registro é a tentativa de telefonar no Brasil. Primeiro tem a coisa toda das operadoras, que nem eu sei mais como funciona. Mas tem a burocracia de comprar o cartão: precisa de um número de CPF. Eu tenho e acabo comprando cartão para todos os meus colegas estrangeiros. Depois disso, dependendo da operadora, vem a loteria: conseguir ligar para o tal número de serviço para fazer o desbloqueio. Geralmente leva uns dois ou três dias para conseguir ser atendido ao mesmo tempo em que o sistema não está fora do ar. Hmmmm. E depois de uma semana vem uma mensagem: seu período de teste gratuito da internet terminou. Jura que eu tinha internet? Não tinha percebido...
E a saga continua. Se for de um lugar para o outro dentro do Brasil, o melhor é comprar um chip em cada cidade: roaming é um assalto, mas todo mundo do país já sabe isso de cor. Então, sobre os vôos internos: tenha um saco de paciência. Os voos atrasam mais vezes do que funcionam. E mesmo se saírem no horário, prepare-se para lidar com gente despreparada. Vou citar um exemplo real: em um voo da cidade A para a cidade B, a mocinha da companhia aérea disse que, como a aeronave era muito pequena, haviam restrições para a bagagem de cabine. Minha companheira de viagem levava uma mala de cabine padrão, dessas que cabem até em teco-teco. Mas a mocinha da companhia cismou e disse que não, que não cabia. Afirmou que só poderiam ir na cabine malas que coubessem no “engradado” de medida. Pois bem, a mala cabia perfeitamente lá: entrava sem esforço. Mas a moça não quis saber e disse que despacharia de qualquer jeito. Minha amiga, sem querer criar caso, concordou. Tirou o computador da mala e colocou na esteira para despachar. Então a mocinha da companhia diz: como a senhora está despachando uma segunda mala, vai ter que pagar uma mala extra.
Aqui na Europa é até comum encontrar voos em aeronaves pequenas e lotadas. Nesse caso, a companhia pede ao passageiro para despachar a mala de cabine – sem custos! – a fim de liberar espaço interno. Sim: o passageiro faz o favor de permitir que a companhia despache a mala que ele teria o direito de levar consigo. Mas não nessa empresa. Com a cara mais azul do mundo, a mocinha exaltada insistia no pagamento da mala extra. O absurdo foi tanto que perguntei se não podíamos parar tudo e fazer o check-in com uma colega dela. Por fim, enfezada e grosseira, ela disse que faria o favor de despachar a mala na franquia de um outro passageiro que havia embarcado sem bagagem. Hã? Pois...
Pra espantar tanta uruca, nada melhor do que fazer um lanchinho. Então fui na Casa do Pão de Queijo e pedi um. Afinal, só quem vive longe do Brasil sabe o quanto vale um pão de queijo... Ai... “Não tem pão de queijo, senhora”, disse a mocinha. Hmmmm Então um café? Ela me olha espantada, afinal devem estar uns 45 graus na rua e o aeroporto – em obras pra Copa – ainda não tem ar condicionado. “A máquina não está funcionando”. Bem, uma água serve.
Mas afinal nem tudo é desgraça e o povo brasileiro é amistoso. Por isso, tem gente simpática também, como o recepcionista do hotel que foi me mostrar o novo quarto (já que no meu o ar condicionado não funcionava) e depois checou meus dados no sistema do hotel e, com o meu nome completo, me adicionou no Facebook. Bem assim, profissional.