Não existe tempo ruim: o importante é usar a roupa certa
As
temperaturas costumam chegar aos -20 graus em algumas regiões da Alemanha
durante o inverno. Isso inclui Berlin. Mas ondas de frio tão intenso duram
poucos dias, por sorte. Em média – sem contar os alpes e montanhas – os dias
ficam entre -5° e + 5 por seis
longos meses. Então, pra quem chegou agora, ou vai chegar no meio desse
período, algumas dicas podem ser úteis e ajudam a evitar maiores complicações.
Já fiz um post para quem planeja fazer turismo no inverno, mas esse aqui é um
pouco mais completo.
A primeira das dicas é
simples: é frio e você vai ter que se acostumar com isso, de qualquer maneira.
Por isso, quanto antes, melhor. E a melhor coisa é entender que é inverno e não
adianta querer transformar a casa em uma filial dos trópicos que a coisa não
vai funcionar. Por isso, compre um termômetro e regule o aquecimento de forma a
criar conforto térmico, mas sem tornar as suas saídas de casa um tormento. A
temperatura ideal para o ambiente em que se passa a maior parte do tempo é
entre 18 e 21 graus. Mais que isso é puro exagero. Para dormir, entre 17 e 19
graus. Além de ajudar na saúde, esse cuidado ajuda no bolso! Apesar do
aquecimento ser pago mensalmente, junto com o aluguel, no final de cada ano é
feito um ajuste: o estado verifica se você consumiu mais do que pagou ao longo
de um período e é preciso quitar o excedente (raramente se recebe de volta). E
as contas costumam ser bem salgadas. Já vi gente recebendo 2 mil euros extras
para pagar, de uma vez só, em um apartamento de três pessoas.
Pé quente
Para não sentir frio
dentro de casa, aposte em roupas confortáveis: se tiver os pés sempre gelados,
sapatos forrados de pelinhos resolvem. Pode até ser um Croc muito feio, com
pelúcia por dentro, desde que ninguém veja (nas lojas de quinquilharias – tipo Teddy
ou McGeiz, vende por uns 5 euros). Ou mesmo uma bota forrada de pelo: eu tenho
uma dessas só pra usar em casa, assim não fico arrastando sujeira da rua. Paguei
7 euros na Kik: é feia de doer, mas é a coisa mais quentinha que já usei na
vida. Para os menos friorentos, chinelinhos de pano também resolvem ou um tênis
confortável. Havaianas só se for com meia: pés de fora é coisa para o verão.
Não dá para manter aqui os mesmos hábitos do Brasil. E não ande descalço, claro.
Falando em pés
gelados, uma dica pra quem não consegue se esquentar são as bolsas de água quente.
Também podem ser encontradas mas lojas de bugigangas. Existem um capas
apeluciadas para elas, bem fofas, e ficam com mais cara de travesseirinho do
que aquelas bolsas de antigamente. Eu tenho uma linda demais que ganhei de uma
amiga e acho uma delícia colocar nos pés nas noites mais geladas.
Existem ainda umas
bolsinhas de gel com a mesma função das bolsas de água quente: mas para os
bolsos! Uma delícia. Você coloca na água quente antes de sair de casa, seca,
enfia nos bolsos e pronto: mãos quentinhas em todo o trajeto. E luvas, claro:
luvas de lã não são muito eficazes, já que os furinhos deixam o vento passar.
As de couro são caras, mas boas. Um meio termo são as de fleece: mais fechadas
que as de lã e bem mais baratas que as de couro. Se o frio for muito mesmo, vale
apelar para as luvas de ski, fofinhas e acolchoadas. Tudo isso baratinho na Kik
ou lojinhas de Bahnhof.
Na hora de sair
Aliás, sair de casa
exige um preparo. De nada servem muitas camadas se a roupa estiver errada.
Primeiro é preciso dizer que você vai precisar de um bom casaco. Sugiro comprar
aqui: os brasileiros são caros demais, finos demais e decotados demais. É
preciso ter algo que realmente bloqueie o vento, que seja de preferência
impermeável – ou ao menos uma lã grossa o bastante para não absorver a água e
deixar você molhado – e bem fechado no pescoço. O ideal são casacos na altura
do joelho ou um pouco abaixo, já que protegem melhor as pernas. Se puder,
compre um com regulagem nos punhos, para deixar fechadinho e evitar que entre
frio pelos braços. Existem modelos e preços variados: em lojas bem baratas,
como a Kik e a Primark, dá para achar um que sobreviva um inverno. Na C&A
já são um pouco mais resistentes. Outra dica é pesquisar nos brechós da cidade:
sempre se acha alguma coisa bacana e exclusiva! Mercados das pulgas (Flohmarkt)
também tem roupas: nesse caso a regra é pechinchar e você pode sair de lá com
uma peça bacana por menos de 10 euros.
Palmilhas: lã ajuda a separar os pés do chão congelado
A mesma regra dos
casacos vale para os sapatos. É preciso encontrar uma bota forrada, com sola
grossa e de borracha, preferivelmente com garras para não escorregar na neve. Se
for comprar um sapato ainda no Brasil, evite os que tem sola de couro: são
muito escorregadios. Também deixe os saltos para a volta: eles não combinam com
gelo. No entanto, sapatos menos “preparados” podem servir com algumas
adaptações. Uma boa opção são as palmilhas de lã de ovelha, que se acha nas
lojas de quinquilharias ou mesmo nas de cosméticos (tipo Rossmann ou dm).
Custam entre 1 e 3 euros e realmente funcionam: elas não deixam passar tanto
frio pela sola do pé. Não use sapatos apertados: botas justas dificultam a
circulação e com isso o pé fica ainda mais gelado. Na hora de comprar, se
planeja usar meias grossas, prefira um número maior. Aliás, falando em meias,
embora as de lã sejam bem quentes, as de algodão deixam o pé respirar melhor! E
meia é uma coisa muito barata aqui na Alemanha: com 5 euros se compra meia
dúzia. Mas nunca compre meias brancas: é um fiasco por essas bandas!
Mas se mesmo nos
mercados de pulga as botas de inverno estiverem além do orçamento, é possível
transformar sapatos de sola lisa em uma opção mais segura. Existem uns grampos
que podem ser presos em qualquer modelo. Encomendar pela internet é a forma
mais barata. Custam cerca de 5 euros pelo ebay.de.
Bom, pés quentes e
casaco. Chegou a hora de falar sobre as calças: primeiro de tudo, mantenha as
bainhas bem feitas ou prefira modelos mais estreitos na perna: arrastar a barra
pelo chão em dias de neve é garantir pernas geladas pelo dia todo. E isso não é
nada bom! Além disso, quando está muito frio ou quando vai se passar várias
horas nas ruas, é preciso usar uma segunda camada. Os supermercados populares
(Aldi, Lidl, etc) ou as lojas simples (Kik, por exemplo) costumam vender essas
roupas de usar por baixo: são calças justas, de um tecido térmico, criadas para
praticar esportes de inverno, mas muito úteis para visitar os mercados de
Natal! Para as mulheres, as opções são mais divertidas: existem meias-calças
com um revestimento interno apeluciado (e outras ainda com o mesmo material das
masculinas) que esquentam bastante. Custam geralmente 5 euros, nas mesmas
lojinhas já citadas e valem muito, muito a pena. Eu gosto mesmo é de usar
vestido no inverno: com uma meia dessas e uma legging bem grossa, não corro o
risco de ficar arrastando neve com a barra da calça por ai.
Nada de calças "baixas"
Sobre as calças, vale
dizer ainda que é hora de dar adeus as calças de cintura baixa. Compre umas “santropeito”
mesmo e seja feliz. Conheci muitas brasileiras que, por conta do hábito de
deixar a barriga ou as costas de fora, ficaram com cistite na primeira semana
de frio. O negócio aqui é colocar uma das blusas por dentro da calça mesmo e
prender bem para não sair: assim evita qualquer chance de deixar as costas ou o
ventre expostos ao frio.
Bom, faltou falar da
parte de cima. É preciso proteger a cabeça e, especialmente, os ouvidos! As
tocas que existem no sul do Brasil não servem para muita coisa aqui. O ideal
são toucas duplas, com uma camada interna apeluciada. O primeiro contato com
elas é de repulsa: são feias, geralmente. Mas uma boa garimpada permite achar
coisas interessantes! Se for comprar um chapéu, não esqueça que o importante é
cobrir as orelhas: se não, serve só de enfeite. Existem protetores de orelha
que funcionam bem até uma certa temperatura. Depois disso é preciso cobrir a
cabeça mesmo.
Outra coisa para usar
sempre: cachecol. Alemães usam até mesmo no verão: lenços, echarpes e afins.
Proteger a garganta é regra por aqui e, se todo mundo faz, deve ter seus
motivos! Para o outono, cachecóis tipo pashminas são ok, mas o frio pede coisas
mais encorpadas, de lã. Use duplo, bem fechado e, se a temperatura estiver além
dos -10, vale colocar por cima da boca e nariz para não respirar o ar tão
gelado. Ah, aqueles cachecóis que as mães e vós costumam fazer no Brasil só
servem se forem feitos com lã grossa e agulhas finas: ou seja, sem muitos
furinhos. Um cachecol de pontos bem apertadinhos faz toda a diferença.
Cuidados com a pele
A pele também precisa
de cuidados especiais no frio. A água na Alemanha é muito calcária e, quanto
mais quente, mais pesada. Isso resseca muito a pele e pode provocar descamações
ou mesmo rachaduras nos cotovelos, joelhos e tornozelos em pouco tempo. Por
isso, mesmo que no Brasil a pele tendesse a ser oleosa, por aqui ela vai precisar
de muito hidratante. E isso vale para os homens também. Os hidratantes brasileiros dificilmente
ajudam, já que não são oleosos o bastante. Melhor mesmo é apostar em um leite
hidratante. Marcas como Nivea, Dove e Bebe tem várias opções, mas mesmo os
produtos das marcas mais baratas dos supermercados são eficientes.
Os lábios geralmente
são os primeiros a dar sinal de ressecamento e, por conta do batom, as mulheres
podem sentir menos que os homens. Mas como nem todos os dias sobra paciência
para maquiagem, o negócio é ter um bastão hidratante sempre à mão. São
baratinhos: 1 euro ou menos no Rossmann, dm e afins. Mas se o aviso chegou
tarde demais, o ideal mesmo é passar em uma farmácia e comprar um hidratante
labial a base de Bepantol, que cicatriza as rachaduras e evita novas.
Falando em farmácia,
inverno também é época de depressão. Não pelo frio, mas pelas longas horas de
escuridão. Até os alemães sofrem com isso. Para amenizar, duas dicas: a
primeira é comprar comprimidos de Johanniskräuter nas lojas de cosméticos ou
supermercados. São drágeas de uma planta conhecida no Brasil como Erva de SãoJoão e ajudam mesmo a combater a depressão típica dessa época. Não precisa de
receita e custam cerca de 4 euros a caixa com 60 comprimidos. A segunda dica é
buscar sol. Se uma viagem para o Sul da Europa tá fora do orçamento, dá pra “remendar”
com uma ida ao solarium (Sonnestudio). Mas nada de ficar laranja: são três
minutos (não mais!), na máquina mais fraca que o estúdio tiver, com a regulagem
mais baixa. A ideia é só ter luz o bastante para processar vitamina D e voltar
a ser feliz! Enfim, o inverno tem seus segredinhos, mas dá pra sobreviver a
ele.
Camadas certas de roupa
Em um resumão para
fechar o post, na hora de planejar a roupa pra sair de casa, pense sempre em camadas
e lembre-se que dentro de todos os ambientes (mesmo ônibus e trens) é quente.
Em alguns, como lojas de departamentos, exageradamente quente. Então o ideal é
usar peças que permitam abrir e deixar um ar entrar pra não sufocar! Uma boa dica,
que funciona muito bem entre -5 e -15 é a seguinte sequência: uma camiseta de
algodão, manga longa, bem justa junto ao corpo. Um pulôver de lã justinho. Um
casaco de fleece, aberto na frente, bem justo também: de preferência de gola alta
(vende na Kik a partir de 5 euros e na C&A por 9). Por cima de tudo, o casaco
grosso, cachecol, touca, luvas. Na parte de baixo, meia-calça apeluciada de fio
600, calça jeans (ou outro material quente, como veludo) grossa e de cintura
mais alta. Meia de algodão grossa e sapatos de inverno com palmilhas de lã.
Hidratante no rosto e mãos, protetor labial e boa sorte!
E como dizem os
alemães: „Es gibt kein schlechtes Wetter, sondern nur ungeeignete Kleidung“.
Não existe tempo ruim, existe apenas roupa inapropriada!
Se depois de fazer
tudo isso o frio ainda for demais, aproveite o clima natalino e pare na
primeira barraquinha que encontrar e peça um vinho quente, o tradicionalíssimo
Glüwein. Sugiro pagar o extra e pedir uma dose de licor de amêndoas junto:
esquenta o corpo, a alma e deixa o inverno muito mais colorido!
Lá fora: é frio sim, mas o inverno é cheio de encantos